Desculpe, mas creio que alguém com um mínimo de bom senso e moderada compreensão da realidade social, comunitária, política sabe a resposta certa à pergunta da matéria do Estadão (ver tb abaixo). Parece evidente por suas articulações que a bancada religiosa no Congresso nacional quer uma epidemia de crack para alimentar suas comunidades terapêuticas – ou as de seus aliados – com parte dos 4 bilhões do programa de governo "Crack: É Possível Vencer". E parte do governo quer agradar essa bancada, inclusive aquela ministra que quer o governo do Paraná e tem nos religiosos sua base eleitoral. Colocar interesses políticos diante de uma política de saúde pública efetiva e baseada nos fatos nos parece canalhice.
Desviar recursos do Ministério da Saúde para confinar dependentes de drogas em instituições sem nenhuma credibilidade, sabendo que os ambulatórios são muito mais adequados e eficientes, e que 90% dos internados voltam a usar drogas no mes seguinte à internação, é mais um tapa na cara em que ousa pensar que este país tem futuro:
Não são zumbis. A epidemia é de crack ou de abandono?
"Crack: É Possível Vencer". Traduzindo, é possível resolver o problemas das pessoas que estão fumando crack e se auto-destruindo ou se prejudicando no processo. Levar essas pessoas a pensar se vale a pena o estilo de vida que estão levando, se o fugaz prazer da cocaína fumada compensa o preço que se paga. Levar essas pessoas a pensar se elas podem estudar, trabalhar, ter relacionamentos e amizades construtivas e verdadeiras, fazer parte da sociedade, ter boa saúde e capacidade para realizar suas metas e objetivos e sonhos – que é um plano de vida básico comum a maioria das pessoas – e fumar crack ao mesmo tempo.
Como com qualquer droga, muitos conseguem isso. Mas a “preocupação” é com aqueles que estao nas ruas vivendo em cidades de crack, os que nao conseguem levar a vida e fumar crack sem chamar atenção. Essa preocupação na realidade é uma oportunidade para ganhar dinheiro. Quem se preocupa com um bando de gente pobre sem eira nem beira que está se matando em periferias fedorentas da cidade ou em comunidades pobres deterioradas e desvalorizadas? O lance é usar isso para vender uma ideia de epidemia de crack, apresentar uma solução mágica para um problema de saúde pública e cobrar a conta ao governo. Financiar comunidades terapêuticas é financiar o curandeirismo.
Se esses espaços têm de fato intenção filantrópica e conseguem financiamento de pessoas físicas ou de empresas e organizações da sociedade civil, ninguém tem nada com isso, desde que nao haja desrespeito aos direitos humanos e preservação das liberdades individuais dos indivíduos atendidos.
As clínicas de 12 Passos acreditam de fato na doutrina criada pelos fundadores dos Alcoólicos Anônimos nos EUA, nas décadas de 1930 e 1940. A porta da clínica está aberta para os que quiserem abandonar o programa, e é um empreendimento rentável pago pelos dependentes de drogas (e qdo se fala drogas o álcool está no centro delas) ou seus familiares, que nao recebe um tostão dos cofres públicos.
As clínicas de 12 Passos mantidas pelo governo, como as criadas pelo governador Garotinho no início dos anos 2000, acabaram por tornar-se centros de doutrinação evengélica. E assim nao dá, na decorrente esculhambação da mescla de religião e terapia o paciente nao consegue pensar no seu problema e se tratar. É certo que vai sair dali, talvez um pouco mais gordo e com aparência melhor, para o local onde vai comprar sua bebida ou sua outra droga de preferência.
Talvez programas mais importantes, agora que esse engodo do PLC 37 veio à tona, são:
“Corrupção e Impunidade: É Possível Acabar”
“Polícia: É Possível Desmilitarizar”
“Educação e Saúde: É Possível Investir Mais”
Por fim, constato com tristeza ou indiferença de historiador, como pode ter futuro um país que perde um tempo enorme e gasta preciosos recursos com projetos de leis como esse desse tal de Osmar Terra?
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